No último dia 5/07, foi publicado no Jornal Oficial da União Europeia mais um diploma dedicado à regulamentação da responsabilidade corporativa pela sustentabilidade: a CSDDD, conhecida como Diretiva do Dever de Diligência das empresas em matéria de sustentabilidade (DIRETIVA (UE) 2024/1760).
Sabendo que as empresas de grande dimensão na sua maioria dependem de cadeias de valor mundiais e com muitos impactos desconhecidos, a CSDDD reforça o conceito de “dever de diligência”, que foi desenvolvido nas Linhas Diretrizes para as Empresas Multinacionais da Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Económicos (OCDE), e abrangem tanto matéria de direitos humanos quanto questões ambientais e de governança empresarial.
Com o objetivo de exercer um dever de diligência adequado em matéria de direitos humanos e ambiente no que diz respeito às suas operações, das suas filiais e dos seus parceiros comerciais nas cadeias de atividades das empresas, as empresas abrangidas pela diretiva deverão: (i) integrar o dever de diligência nas suas políticas e nos seus sistemas de gestão dos riscos, (ii) identificar e avaliar e, (iii) se necessário, priorizar, prevenir e atenuar os efeitos negativos, reais e potenciais, nos direitos humanos e no ambiente, bem como fazê-los cessar e minimizar a sua extensão, conceder reparação em relação aos efeitos negativos reais, desenvolver uma colaboração construtiva com as partes interessadas, estabelecer e manter um mecanismo de notificação e um procedimento de reclamação, monitorizar a eficácia das medidas tomadas em conformidade com os requisitos previstos na presente diretiva e comunicar publicamente informações sobre o seu dever de diligência.
Para que o dever de diligência acima, de facto faça parte das políticas e dos sistemas de gestão dos riscos das empresas, é exigida na nova regulação uma alteração na governança das empresas, que deverão dispor de uma política de dever de diligência e integra-lo nas suas políticas e nos seus sistemas de gestão dos riscos internos.
Em termos de âmbito de aplicação, a CSDDD obriga, de forma gradual, o seguinte conjunto de empresas:
- empresas com mais de 5 mil trabalhadores e 1,5 mil milhões de euros de volume de negócios;
- empresas com mais de 3 mil funcionários e 900 milhões de euros de volume de negócios; e
- empresas com mais de mil trabalhadores e 450 milhões de euros de volume de negócios.
Ao longo das 58 páginas, princípios e conceitos importantes são apresentados na nova diretiva, para esclarecer às empresas o que passa a ser exigido em matéria de efeitos negativos reais e potenciais nos direitos humanos e no ambiente, no que diz respeito às suas próprias operações, às operações das suas filiais e às operações efetuadas pelos seus parceiros comerciais. Dentre estes conceitos, destaca-se o de “cadeia de atividades”, que significa:
- as atividades dos parceiros comerciais a montante da empresa relacionadas com a produção de bens ou a prestação de serviços por essa empresa, incluindo a conceção, extração, aprovisionamento, fabrico, transporte, armazenamento e fornecimento de matérias-primas, produtos ou partes de produtos e o desenvolvimento do produto ou do serviço, e
- as atividades dos parceiros comerciais a jusante da empresa relacionadas com a distribuição, transporte e armazenamento de um produto dessa empresa, quando os parceiros comerciais exercem essas atividades para a empresa ou em nome dela, e excluindo a distribuição, transporte e armazenamento de um produto que esteja sujeito a controlos das exportações no âmbito do Regulamento (UE) 2021/821 ou a controlos das exportações de armas, munições ou material de guerra, depois de autorizada a exportação do produto.
Interessante notar que este conceito de cadeia de atividades e consideração do conjunto do ecossistema empresarial que une empresas grandes e pequenas serve também na nova norma para marcar obrigações em relação às PME, que inevitavelmente terão mais dificuldades e menos recursos para se adaptarem à avalanche regulatória. Neste contexto, a CSDDD expressamente prevê que as empresas incluidas no seu escopo de obrigações deverão também:
- prestar apoio específico e proporcionado a uma PME que seja um parceiro comercial da empresa, se necessário à luz dos recursos, dos conhecimentos e das limitações da PME, nomeadamente facultando ou facilitando o acesso a atividades de reforço das capacidades, formação ou atualização dos sistemas de gestão e,
- caso o cumprimento do código de conduta ou do plano de ação corretivo comprometa a viabilidade da PME, facultando apoio financeiro específico e proporcionado, nomeadamente financiamento direto, empréstimos com juros baixos, garantias de aprovisionamento contínuo ou assistência na obtenção do financiamento.
Adicionalmente, vale destacar ainda que a CSDDD expressamente esclarece que não prejudica as obrigações nos domínios dos direitos humanos, laborais e sociais, da proteção do ambiente e das alterações climáticas impostas por outros atos legislativos da União. Se as disposições da CSDDD colidirem com disposições de outro ato legislativo da União que visem os mesmos objetivos e prevejam obrigações mais amplas ou mais específicas, as disposições do outro ato legislativo da União deverão prevalecer no que diz respeito à matéria em conflito e aplicar-se a essas obrigações específicas.
Como próximos passos e prazos, destaca-se que os Estados-Membros tem até 26 de julho de 2026 para transpor a Diretiva e publicar as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento aos termos da CSDDD nacionalmente.
A partir de 26 de julho de 2027 o primeiro grupo de empresas já se encontra obrigado às medidas previstas no texto da Diretiva, e de forma gradual até 26 de julho de 2029 todas as empresas destinatárias da regulação deverão cumprir os seus termos.
Apesar de fazer crescer o já considerável volume de obrigações que são objeto de estudo e implementação das empresas, a CSDDD marca, uma vez mais, a preocupação da União Europeia em explorar melhor o potencial do mercado único de modo a contribuir para a transição para uma economia sustentável, e reforça a importância de medidas que tenham dimensão transnacional nesta jornada. Nunca foi tão importante estabelecer parcerias transparentes, sólidas e que agregam os esforços pela transição climática, social e de governança que se impõe fazermos, e o “dar as mãos” entre empresas grandes e PMEs passa a ser elemento central e estratégico deste esforço transversal.
Artigo escrito por Alice Khouri para a newsletter mensal “Energia em Ordem” que pode segui no Linkedin da Helexia.