Numa altura em que tanto se discute a retenção de talento e os benefícios que fazem a diferença, Maria João Melo, diretora de Recursos Humanos da Helexia Portugal, propõe um olhar mais profundo — e muitas vezes negligenciado — sobre o verdadeiro fator que leva as pessoas a ficar (ou a sair) de uma empresa: o ambiente de trabalho. Neste artigo para a revista Human Resources, desafia ideias feitas, convida à reflexão e recorda que, no coração de qualquer organização saudável, estão o respeito, a escuta e a autenticidade — mesmo quando tudo o resto parece estar no lugar.
Há empresas onde ninguém grita, mas todos se calam. Onde os dias não correm mal, mas também nunca chegam a correr bem. Onde os salários até são justos e os projetos interessantes, mas há qualquer coisa que falta. Falo do ambiente de trabalho – ou clima organizacional, como lhe chamam os manuais – esse fator tão decisivo quanto negligenciado quando se fala em retenção de talento.
O ambiente não se mede em dashboards, nem aparece no organigrama. Mas sente-se. Está na maneira como os corpos se movem, nas pausas que se evitam, nas ideias que morrem antes de nascer. Está nos silêncios. Na distância subtil entre colegas. No cuidado excessivo ao falar. E quando esse ambiente se torna pesado, os melhores acabam por sair. Não por ambição ou mais dinheiro, mas porque não se sentem parte.
Criou-se uma ideia perigosa de que reter talento depende de benefícios visíveis. Mais um bónus, mais um evento, mais uma mesa de pingue-pongue. Mas o que faz alguém querer, de verdade, ficar é quase sempre aquilo que não se vê. É a liberdade de dizer o que se pensa sem medo, o espaço para ser vulnerável sem perder valor. E a certeza de que se pode errar, aprender e continuar a ser respeitado.
Cuidar do clima de uma equipa é um trabalho invisível, mas decisivo. Exige escuta ativa, tempo, e uma liderança que não se proteja atrás de cargos, mas que se exponha, que dê o exemplo, e que saiba ser exigente sem ser opressiva. É um equilíbrio fino, feito de humanidade e de atenção.
As empresas que ignoram isto podem ter tudo – talento, produto, investimento – e, ainda assim, perder o essencial. Porque as pessoas podem até aceitar um salário mais ou menos, uma fase difícil, um desafio enorme. Mas não aguentam a ausência de sentido e de pertença.
E quando vão, nem sempre dizem porquê. Às vezes nem sabem. Mas o que os levou a sair estava lá desde o início: no que não se disse. No que se tolerou. No que faltou. No que não se viu.